sábado, 12 de maio de 2007

FAST FOOD VERDE- Nuno Markl

Dou por mim a constatar que os restaurantes de “fast food” estão a ficar sinceramente efeminados. Têm ido a estes restaurantes ultimamente? Ou têm visto os anúncios? “Ah, agora temos sopinhas… Ah, agora temos maçãs…”
Eu sei que vocês, pessoal dos restaurantes de “fast food”, têm aquele clássico sentimento de culpa por causa do estado em que as pessoas ficam depois de se alimentarem todos os dias com as vossas iguarias, e que a partir do momento que têm sopinhas e saladas e maçãs, podem sempre dizer qualquer coisa como “OK, aquele senhor teve um ataque cardíaco, mas não foi por não lhe dizermos para comer saladinhas. Vejam ali em cima – saladas, sopas, maçãs. Nós avisámos. Não temos culpa que em vez de uma maçãzinha ele tenha escolhido um DOUBLE SUPER HIPER CHEESE BACON MAX KING CHICKEN.”
Não, a sério – eu percebo a intenção deles… Mas uma das sensações boas que recordo do tempo em que era ávido consumidor de restaurantes de “fast food” era o ar de vício, de fruto proibido que se respirava assim que se entrava num destes restaurantes. (...)
Agora os tempos mudaram. Agora é possível ver pessoas comerem saladinhas em restaurantes de “fast food”. O que – há que dizê-lo – não é uma coisa tão descabida, na sua essência, como isso. Haverá comida mais rápida do que uma folha de alface? É arrancar da terra, lava-se, toma lá com o azeite e o vinagre e come.Um hamburger? Temos a vaca, é preciso matar a vaca, é preciso cortar a vaca aos bocados, é preciso picar a carne da vaca, é preciso organizar a carne picada em rodelazinhas, é preciso grelhar as rodelazinhas durante uns minutos, temperar as rodelazinhas, virar as rodelazinhas para cima e para baixo durante uns minutos, e finalmente servir as rodelazitas e comê-las.
Numa competição entre a alface e a vaca, a alface ganha, de caras, o prémio “fast food”. Por isso, na sua essência, uma cadeia de restaurantes que sirva saladas oferecerá aos seus clientes a food mais fast da História. Ainda a pessoa não acabou de dizer “EU QUERIA UMA SALADA” e quando chegar à sílaba “LA” da palavra “SALADA” já está a mastigar folhas. É o quão rápido seria um restaurante de saladas.Seja como for, para todo o sempre, o conceito “fast food” consiste na selecção das menos saudáveis coisas que uma pessoa pode introduzir no organismo. Nada contra – todos sabemos o risco, todos conhecemos a mística. E a mística consistia no facto de qualquer um de nós poder entrar num destes restaurantes e dizer “QUERO UM SUPER DOUBLE CHEESE CRISPY BACON SHIT TRIPLE JUMBO MAXI PRIEST” ou dizer “QUERO UM ATAQUE CARDÍACO ANTES DOS 40 E PARA A SOBREMESA UMA TAÇA CHEIA DE COLESTROL – SE POSSÍVEL QUEIMADINHO POR CIMA”, que seria exactamente a mesma coisa.
Agora não. Agora já não me sinto um perigoso transgressor se entrar num destes restaurantes. Há lá coisas que saíram, de facto, da terra. Da terra, senhoras e senhores. Onde é que vamos parar? É verdade que alguns destes restaurantes começaram a avançar por estes caminhos quando começaram a servir sumo de laranja. Sumo de laranja, senhoras e senhores. A parte positiva é que quando alguém com quem eu ia jantar a um destes restaurantes pedia sumo de laranja, eu podia sempre dizer aquilo que me dizem a mim quando bebo cola num bar em que toda a gente está a beber álcool. Isso era uma sensação agradável. Eu, num destes restaurantes, a mamar um copázio de cola, e um ignóbil qualquer de um amigo meu com um suminho de laranja era logo coisa para eu dizer: “OLHA, OLHA… TEMOS MENINOS!”
Agora isso perde o impacto. Agora há verduras por todo o lado, nestes restaurantes.
Uma coisa que me fascina, num desses restaurantes, é a maneira como as maçãs são servidas. Elas vêm às rodelas, dentro de uns saquinhos daquele plástico dos pacotes de batatas fritas. Eles sabem-na toda.
Nenhum puto dos dias de hoje comeria uma maçã normal. Inteira. Redonda. Eles nem sabem o que é uma maçã. E se virem uma, têm medo. Vai daí, nada como cortar a maçã em rodelas, como as batatas fritas, espetar com elas dentro de pacotes de plástico – e isso sim, isso é a linguagem que os putos conhecem! E por amor de Deus, que ninguém lhes diga que aquilo nasce nas árvores. NÃO! Não estraguem o arranjinho. Maçãs. Em pacotes. Aquilo é feito. Em fábricas. Aquilo sai já em rodelas das fábricas. São fábricas em Hong Kong a produzir rodelas de maçã massivamente.
E que ninguém diga aos putos que aquilo faz bem. Todos nós já fomos crianças, todos nós sabemos que não há maior “turn off” na nossa relação com um alimento do que alguém dizer que ele faz bem. Se a vossa criança vos perguntar: “Papá, mamã, a maçã faz bem?”, a única resposta possível será: “TÁS MALUCO, PÁ? A MAÇÃ DÁ-TE CABO DOS DENTES, MIÚDO. OLHA A MAÇÃ FAZ BEM, DIZ ELE. A MAÇÃ? É UM VENENO. NÃO HÁ NADA QUE FAÇA PIOR QUE UMA MAÇÃ FRESCA. ESTÁS DOIDO? NÃO COMAS ISSO, PÁ...”

in http://www.havidaemmarkl.com/

3 comentários:

The Man disse...

engraçado, mas não concordo...
mesmo antes dos "venenos" fruta e saladas existirem nos fast food já era possível comer lá sem sentimentos de culpa ;)
como??? muito simples, quando chegar a nossa vez de pedir, diz-se q se quer o hamburger sem molhos ;) e se as batatas estiverem a sair na hora, q tirem as vossas antes de as afogarem no sal...
é ja um principio ;)

Ana Ribeiro disse...

O texto do Nuno Markl é um texto humorístico, mas que na essência fala de um assunto muito importante.
Felizmente, no fast-food começam a surgir opções saudáveis, e como já foi dito num outro post, fast-food não precisa ser sinónimo de junk-food.

Unknown disse...

Muito interessante mas o texto foi escrito de uma maneira q vai afastar os tais "putos", pela forma de os chamá-los, ao em vés de aproximá-los!...
Tente uma maneira de os chamá-los mais carinhosamente ou um nome ñ tão forte!
No restante esta de parabéns